Tramitam dois Projetos Leis: O PL 6.583/2013, na Câmara dos Deputados, de autoria do Deputado Anderson Ferreira (PR-PE), intitulado de Estatuto da Família e o PLS 470/2013, no Senado, de autoria da Senadora Lídice da Mata (PSB-BA), intitulado de Estatuto das Famílias.
Os PLs caminham em sentidos opostos e a diferente flexão de número entre os nomes denuncia bem os sentidos em que se propõem. Enquanto o primeiro (PL 6.583), que encontra-se no singular, restringe a entidade familiar apenas aos relacionamentos heteroafetivos, excluindo todos os outros tipos de formação familiar, como a homoafetiva, o segundo PL, no plural, sugere o reconhecimento de todos os tipos de entidades familiares e as protege.
Só poderá vigorar um desses PLs.
A norma projetada, de autoria do Deputado Anderson Ferreira, em seus 15 artigos que insistem em apontar uma única entidade familiar, constituída por casais heteroafetivos exclusivamente, parece-me excludente e homofóbica, desafia as principais decisões e entendimentos do STF e STJ neste tema e representa um retrocesso no reconhecimento doutrinário e jurisprudencial avançado pelas décadas decorridas após a atual Constituição Federal.
Já o Estatuto das Famílias, sofisticada e atual norma projetada, representa, ao meu ver, um importante avanço legal no viés do Direito de Família, positivando aquilo que a doutrina e jurisprudência já reconhecem. Franqueia valor jurídico às diversas formas da entidade familiar, além de tratar de outros importantes aspectos jurídicos.
Recentemente foi publicada, por um jornal de importante circulação, matéria com título denunciando que a lei projetada (470/13) pode conceder à amante os mesmos direitos do cônjuge. Isso não existe.
Primeiramente, importante conceituarmos o significado da palavra amante: trata-se de caso amoroso ou meramente sexual, extraconjugal, esporádico, eventual e mantido de forma sigilosa. Trata-se de traição, ato ilícito e vedado por nosso sistema jurídico e que pode causar consequências seja no aspecto cível, seja no âmbito do direito de família.
A traição, por ser ato ilícito, se causar ao outro algum tipo de dano, material ou moral, será passível de indenização. Outrossim, quem trai perde o direito aos alimentos côngruos, que são aqueles destinados à manutenção do padrão de vida, além de perder o direito ao uso do sobrenome da pessoa inocente, em caso de divórcio.
Nosso sistema jurídico preserva e homenageia a monogamia, desde a Constituição Federal até as normas infraconstitucionais e o dispositivo em comento não pretende favorecer uma amante, nem incentivar ato ilícito e imoral da traição, muito pelo contrário.
Recentemente (05/01/2015, 8 horas), concedi entrevista à Rádio Justiça em que defendi que a traição é repudiada por nosso sistema jurídico e por nossa sociedade e o Estatuto das Famílias nada refere-se ao amante. Explico:
O parágrafo único do artigo 14 assegura ao companheiro direitos típicos de todos aqueles integrantes da entidade familiar, incluindo o cônjuge, em caso de união estável paralela ao casamento.
Esta União Estável paralela não se confunde com mero amante. Uma união estável representa um relacionamento entre duas pessoas, de forma ininterrupta, pública e com o afã de constituir família. Diferente de uma mera e ocasional relação amorosa ou sexual de forma sigilosa.
Portanto, este dispositivo tratado no estatuto projetado relaciona-se com casos em que há um casamento entre duas pessoas e uma delas, ao mesmo tempo, mantém uma união estável com uma terceira pessoa. Visa preservar os interesses e direitos desse companheiro.
Outrossim, a jurisprudência já aponta esse mesmo sentido, no afã de preservar os interesses da companheira ou companheiro desde que este esteja de boa-fé, ou seja, desde que este desconheça o fato de que seu consorte é de fato casado.
Por fim, o único ajuste a merecer o art. 14 é a inclusão da ressalva que o dispositivo aplica-se quando há o requisito da união estável putativa, ou seja, de boa-fé, uma vez que, conhecendo o companheiro que seu consorte é casado de fato, esta união passa a ser de má-fé, participando da ilicitude e prestigiando o ilegal.