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O ator britânico Cary Grant tinha razão, “O divórcio é um jogo que é jogado por advogados”. A frase foi eternizada a partir da década de sessenta, mas ainda é capaz de refletir uma verdade extraída de muitos processos de divórcio. Costumo afiançar aos meus clientes que o único que ganha com uma boa disputa judicial é mesmo o advogado. Todos perdem: os litigantes perdem, os filhos perdem, os familiares e amigos perdem, o judiciário perde. Só os advogados ganham, e costuma ser muito.

Isso porque a disputa judicial nas varas de família é como um jogo de xadrez jogado por advogados, misturado com o jogo da velha jogado pelos litigantes. O planejamento estratégico é crucial, todos os movimentos devem ser cuidadosamente pensados e repensados, o desenho das variáveis possíveis deve estar considerado, assim como num jogo de xadrez, onde o movimento de um simples peão é tão importante quanto de uma torre. Tudo isso para o alcance de um objetivo traçado pelo cliente e o cliente que alcança tal objetivo se reconhece como vitorioso sem perceber o custo que experimentou para chegar a tal vitória judicial, custo não apenas financeiro mais também o custo psicológico deixado pelos estratagemas processuais os quais vitimizam principalmente as crianças, assim como em um jogo da velha, quando acaba em velha e ninguém ganha.

Mas a evolução do sistema normativo tem suas boas implantações, assim como ocorreu a partir da Emenda Constitucional 66/2010, que alterou o artigo 226 da Constituição Federal e tornou irrelevante a culpa para a maioria dos divórcios, ou ainda, a Lei da Guarda Compartilhada que alterou o artigo 1.583, do Código Civil, frustrando a prática da alienação parental em muitos casos.

Antes da EC 66/2010, para o divórcio ser decretado havia, obrigatoriamente, a necessidade de preencher alguns requisitos: i) o casal deveria estar separado judicialmente por pelo menos 1 ano; ou ii) o casal deveria estar separado de fato por pelo menos 2 anos; ou iii) um dos consortes deveria ser condenado pela prática de grave descumprimento das obrigações do casamento (infidelidade, p. ex.).

Assim, a própria lei incentivava a disputa combativa, uma vez que, não preenchido os requisitos da separação judicial ou de fato, um (1) ou dois (2) anos respectivamente, o consorte que desejasse o divórcio era obrigado a imputar culpa ao outro, expondo sobremaneira a intimidade do casal, explorando traições e comportamentos, muitas vezes inexistentes em acirradas disputas judiciais. Felizmente isso acabou.

Outro avanço que merece destaque é a Lei da Guarda Compartilhada, Lei nº 13.058/2014, que alterou o artigo 1.583, do Código Civil. Hodiernamente a guarda deve ser fixada de forma compartilhada, mesmo que os genitores litiguem e ostentem desarmonia. Só poderá ser fixada unilateralmente se um dos genitores declarar expressamente que não quer exercer a guarda ou quando um deles não reunir condições para o exercício do poder familiar, ou seja, algo muito grave.

Apesar de ainda não estar bem compreendida, ou interpretada por outros vieses por alguns juízes, a lei de um modo geral já trás significativos avanços. Um dos resultados da Lei da Guarda Compartilhada é a redução sensível da prática de alienação parental exercida por um dos genitores, que disputa a guarda de sua prole com o propósito de punição ou moeda de troca. Sendo a guarda, como regra, compartilhada, este estratagema processual restou frustrado.

Certamente ainda vai ser melhor interpretada e chegaremos ao entendimento como é hoje o divórcio, um direito potestativo da parte, em que basta um querer para que o divórcio seja decretado, não cabendo sequer defesa. Ainda veremos o desaparecimento das disputas por guarda de filhos, cujo o implemento independe da vontade dos genitores, mas dos interesses dos filhos.

A verdade, contudo, é que enquanto existir pessoas, dotadas de paixões e interesses capazes de corromper a retidão, o divórcio será tema para infindáveis histórias produzidas por Hollywood, mesmo que boas iniciativas apareçam, como, no Brasil, foi a Emenda Constitucional 66/2010 e a Lei da Guarda Compartilhada.

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