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A questão, perigosamente tendente a seguir o caminho diametralmente oposto à atual
construção jurisprudencial e doutrinária, é objeto de julgamento no Superior Tribunal
de Justiça – STJ, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi e está suspenso por pedido
de vistas do Ministro Marco Aurélio Bellize.

Neste recurso, uma mulher pretende a partilha de cotas sociais em nome do ex-marido,
com avaliação para a data da partilha(2012) e não da data da separação de fato (2007),
incorrendo, assim, no ganho pela valorização das cotas sociais advindas após a
separação de fato, incluindo-se a variação patrimonial ocorrida naquele período – após
a separação de fato. Para a Ministra, a mancomunhão garante ao cônjuge o direito à
propriedade das cotas sociais, mesmo que este não figure nos quadros societários,
porque todo o patrimônio adquirido na constância do casamento é comum (o regime,
no caso, é o da comunhão parcial de bens). Ainda, porque a esposa viu o seu
patrimônio (mancomunhão) imobilizado na empresa pelo marido, com o propósito de
alavancar o crescimento da empresa, tem direito também ao crescimento patrimonial
advindo, ainda que posterior à separação de fato. Outrossim, porque a mulher se
atrelou à sociedade por força da mancomunhão das cotas sociais, até que haja a
partilha tem direito à eventual evolução patrimonial, assim como ao prejuízo que
eventualmente decorrer daquela atividade econômica.

Como bem ponderado pelo Ministro Marco Aurélio Bellize, uma das razões pela qual
pediu vistas para melhor refletir sobre o caso, a decisão proposta pela Ministra Nancy
Andrighi, no sentido de estabelecer que a partilha terá que ser feita com valores atuais,
mesmo anos após a separação de fato e com eventual valorização patrimonial, poderá
gerar importantes impactos em outros casos, inclusive na hipótese inversa, onde
haveria a necessidade de divisão de prejuízos, caso a empresa assim tenha se
comportado.

De toda sorte, importa refletir que a decisão é tendente a mudar importante construção
doutrinária e jurisprudencial, inclusive do próprio STJ, no sentido de estabelecer que a
separação de fato põe fim à sociedade conjugal e com isso ao regime de bens.

Trata-se de uma construção doutrinária e jurisprudencial, aparentemente até a
indigitada decisão, pacífica e tranquila. Rigorosamente, a separação de fato não
extingue a sociedade conjugal porque o artigo 1.571, do Código Civil, identifica em
seus incisos I ao IV as formas para a dissolução da sociedade conjugal, e não está
identificada a separação de fato, mas somente a separação judicial, inciso III. Ainda,
os deveres de coabitação e fidelidade recíproca só se extinguem com a separação
judicial, nos termos do artigo 1.576. No mesmo sentido, o artigo 8º da Lei do Divórcio, Lei número 6.515/77, estabelece que a separação judicial produz seus efeitos na data de seu trânsito em julgado, ou na data da separação cautelar se houver.

Contudo, em sentido contrário, o próprio Código Civil dispõe, nos termos do artigo
1.723, § 1º, que a pessoa separada de fato pode constituir União Estável, ou seja,
mesmo que casada, mas separada de fato, não constitui-se impedimento para a
validade e eficácia de uma união estável, incluindo regime patrimonial próprio –
regime da comunhão parcial de bens, se não convencionado outro por contrato de
convivência.

Ainda, com a Emenda Constitucional 66/2010, o direito passou a conviver com a
possibilidade de divórcio sem a necessidade de uma prévia separação de fato de dois
anos ou uma judicial por um ano como requisito para o divórcio. Assim, a mais
autorizada doutrina adotou o entendimento que a separação judicial deixou de existir
no sistema jurídico, porque mero procedimento ou fase necessária ao divórcio.

Por fim, não menos importante, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que,
os bens adquiridos após a separação de fato não integram o acervo comum a ser
partilhado (STJ. AgRg no Ag 961.871/GO, Rel. Ministro Ari Pargendler, Terceira
Turma, julgado em 11.3.2008, DJe 15.8.2008.). Natural este entendimento, porque o
regime de bens é estabelecido a partir da presunção de esforço comum na aquisição
daquele bem, presunção esta que naturalmente desaparece após a separação de fato.
Decorre deste mesmo raciocínio a ideia de que a partilha deva obedecer a realidade
existente no momento da separação de fato, mesmo que tais bens, a serem partilhados,
tenham oportunizado rendimentos, ganhos ou até mesmo prejuízos.

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